Perdida na História

Perdida na História

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

A rainha trágica

Isabel I, rainha de Inglaterra, poderia ter mandado executar a sua prima Maria Stuart, secretamente, por razões de Estado. Porém, a lei que fizera votar em 1585, punindo com a morte qualquer pessoa que tivesse participado numa conspiração contra ela, fornece-lhe uma arma legal. Em Outubro de 1586, manda comparecer a ex-rainha da Escócia perante uma comissão especial de 46 membros. Um processo com provas falseadas?

      O círculo volta a fechar-se

      Maria Stuart, Queen of Scots, tem 44 anos no momento do processo. A sua vida não terá passado de uma sequência de acontecimentos trágicos. Filha de Jaime V da Escócia, torna-se rainha da Escócia com apenas uma semana de idade, rainha de França durante um ano, católica, muito bela, ela regressa ao seu país natal em 1561, com 19anos, depois da morte do marido, Francisco II rei de França, encontra um reino agitado pela Reforma.

Maria Stuart


      Manobrando entre as diversa facções, hesitando entre diferentes partidos matrimoniais, volta a casar-se com o seu primo, Henrique Stuart Darnley, do qual tem um filho. Sabe-se que Darnley era profundamente incompetente e muito ausente, por isso, a rainha era frequentemente vista na companhia de músicos, entre os quais um músico italiano Rizzio. A juntar ao conjunto de péssimas qualidade, Darnley era também extremamente ciumento, de tal forma que mata Rizzio em frente à rainha. Ela nunca o perdoará tal ofensa. Após inúmeras traições amorosas à sua esposa e rainha, Darnley é assassinado, provavelmente pelo homem que Maria vem a desposar depois, Lord Bothwell.

Maria Stuart

      Todas estas peripécias fazem escândalo, servindo de pretexto para a revolta dos nobres protestantes. Constrangida a abdicar, Maria Stuart refugia-se em casa de sua prima, a protestante Isabel de Inglaterra, que a mantém sob residência vigiada.

Isabel I, rainha de Inglaterra


      A ex-rainha, Maria, é uma hóspede embaraçosa. Efectivamente, Maria é também bisneta de Henrique VII e não tendo Isabel filhos, ela tem o direito à Coroa. Por outro lado, princesa católica, Maria congrega as esperanças dos "papistas", que nunca terão reconhecido o casamento de Henrique VIII com Ana Bolena, do qual nasce Isabel. Maria encontra-se no centro de várias intrigas com Espanha, que visa colocar Maria no trono inglês.


Maria Stuart

      O seu regime de residência vigiada endurece progressivamente, passando rapidamente a detenção quando surge o boato de conspiração.  Em 1585, Maria é presa no castelo de Chartley, à guarda de um carcereiro impiedoso, Paulet. São-lhe proibidas toda e qualquer carta, assim como qualquer visita. Certo dia, Maria recebe num tubo de madeira um bilhete assinado por um tal Gifford, que lhe propõe servir-lhe de contacto com amigos de Paris e de encaminhar uma correspondência clandestina. Gifford deverá fazer a ligação entre um católico fanático, Babington, que estaria morto por servir Maria e, se possível, assassinar Isabel.



      O plano do complot compreende o desembarque dos espanhóis em Inglaterra, o levantamento dos católicos e a libertação da rainha. Com efeito, ao fim de algumas semanas, os correios, por momentos interrompidos, chegam e partem por um intermediário, um comerciante de cerveja. Maria Stuart está cheia de esperança.

Maria Stuart

       Na realidade, o círculo fecha-se. A 16 de Agosto de 1586, no decurso de uma caçada, uns cavaleiros obrigam-na a segui-los. Enquanto a retêm, Chatley vasculha tudo até à exaustão - sem qualquer resultado. Babington e companheiros são aprisionados, confessando tudo sob tortura. Isabel decide acusar a sua prima de tentativa de assassinato da sua pessoa. Maria é conduzida ao castelo de Fotheringay.

Provas de um crime

      Maria Stuart, culpada ou inocente? Uma coisa é certa: Maria foi vítima de uma cruel maquinação levada a cabo por Walsingham. Este terá introduzido um homem de sua confiança, Gifford, para dar corpo à conspiração e incriminar Maria Stuart: impulsiva, abandonada, a rainha morde o isco.



      Aos juízes resta provar que ela conhecia e aprovava o plano de assassinato de Babington contra Isabel. Duas cartas constituem prova fundamental, obtidas por intermédio do vendedor de cerveja. A primeira, assinada por Babington, não passa de uma cópia, mas uma cópia autenticada pelo autor, possivelmente sob tortura. A segunda, gravosa, é uma resposta de Maria a Babington, cifrada, pela qual a rainha dá conselhos e pede para ser informada do projecto: esta missiva é igualmente uma cópia, curiosamente, escrita em francês, quando o original, segundo o testemunho de um secretário de Maria, fora escrito em inglês...

Maria Stuart

      De qualquer forma, Maria recusa os juízes. É rainha da Escócia, prima de Isabel, e não sua súbdita, não estando, portanto, sob a alçada das leis inglesas. Além disso, os acusadores não podem produzir qualquer documentos, visto os originais terem sido queimados, sendo-lhes impossível demonstrar a traição de Gifford. Paulet, o seu carcereiro em Chatley, procura em vão obter confissões espontâneas. Maria comparece a 14 de Outubro. Uma grande solenidade envolve a ocasião. Entre os membros da confissão, escolhidos a pente fino, figuram o bispo da Cantuária, primaz de Inglaterra, o grande chanceler Bromley, Walsingham.


Boneca Maria Stuart

      Olhando de relance a sala onde o trono da rainha, vazio, fora colocado, Maria murmura: "Vejo aqui muitos juízes, mas nenhum a meu favor".
      A sua defesa é simples: ela ignora todo o caso, a carta cifrada foi forjada, pura e simplesmente forjada. Apela "a Deus e aos príncipes cristãos". Mas logo pelo tom dos juízes logo adivinha o que a espera. Em breve se remete ao silêncio e à dignidade de uma rainha perseguida pela sua fé. A 25 de Outubro, a comissão, por unanimidade menos uma voz, declara a acusada "culpada", sentença equivalente, segundo a lei de 1585, à pena de morte.

Quatro meses de espera

      A condenada deverá esperar 4 meses pela execução da sentença. Durante o amargo prazo, Maria permanece presa em Fotheringay. Pressões, vindas de França, tentam vergar Isabel. A própria condenada, temendo o seu assassínio em segredo, escreve uma carta que "arrancou lágrimas à soberana de Inglaterra", contudo, esta não lhe respondeu.
      A 7 de Fevereiro de 1587, a espera termina. Maria é prevenida que será executada no dia seguinte. O médico, Bourgoing, relatou os seus últimos momentos:



      "Na manhã do suplício, a rainha da Escócia vestiu um belíssimo vestido de cetim preto, de cauda. Crucifixo na mão, ajoelha-se em frente ao cepo, enquanto lhe vendam os olhos com um lenço bordado a ouro que ela própria terá preparado. O carrasco, perturbado, dá um golpe pouco certeiro. É necessário um segundo. Depois, agarra os cabelos para levantar a cabeça e mostrar às testemunhas, mas na mão tem apenas uma peruca cobrindo poucos cabelos grisalhos. Os lábios ainda tremem durante uns minutos. O cãozito de Maria, encontrado enroscado debaixo dela, não quer mover-se."

Ao todo, esteve cerca de 19 anos presa.

Túmulo de Maria Stuart


Assinatura de Mary Stuart, Queen of Scots


Fonte: Astier et al, (2000), Memória do Mundo, Cículo de Leitores 

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