Perdida na História

Perdida na História

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Las Casas

Fixado em Cuba a partir de 1511, o padre Bartolomeu Las Casas denuncia as injustiças que estão na base da da prosperidade espanhola no Novo Mundo: o desprezo radical pelos índios e a sua desavergonhada exploração. 

      Las Casas não é o primeiro europeu a vociferar contra a a exploração dos ameríndios por parte do conquistadores europeus. A sua personalidade e a sua experiência dão uma nova tonalidade ao caso e ao seu protesto. 
      Por incrível que possa parecer, Las Casas é filho de um companheiro de Cristóvão Colombo, tendo nascido em 1474 em Sevilha. Acompanha o seu pai numa segunda viagem do explorador às ilhas e volta depois a atravessar o Atlântico em 1502. Ingressado uns tempos antes na ordem dominicana, licenciado em Direito, ele acalenta o projecto de conduzir do outro lado do Atlântico uma dupla carreira: eclesiástica e administrativa, sonhando com grandes explorações e aventuras, adoptando facilmente o estilo de vida dos colonos.  





      Em 1510 é ordenado padre em São Domingo- a primeira ordenação a ter lugar para lá do Atlântico. Ironicamente, passa a ter uma visão totalmente diferente do assunto quando se começa a aperceber das verdadeiras realidades sociais e económicas daqueles locais. Tal revelação conduz Las Casas a uma enorme reflexão interior que irá modificar radicalmente o seu destino. Efectivamente, algumas fontes históricas referem que é possível que no início o próprio Las Casas tenha tido escravos nas suas propriedades. 

Política

      Cumpre o seu primeiro acto político contra si próprio. Ao ser um colono espanhol, Las Casas tem direito ao sistema de encomienda, ou repartimiento, que lhe coloca à disposição quer terra, quer escravos índios. Las Casas renuncia à terra e à servidão indígena. 

Alternativa à "encomienda"

      Residente em Cuba desde 1511, Las Casas lança-se ferozmente em pregações contra a exploração levada a cabo pelos seus compatriotas: consciente do declínio numérico da população americana submetida a um rigoroso trabalho forçado, exposta a violência, doenças e ao álcool, exortando os compatriotas a demonstrarem moderação relativamente aos índios. 
      A hostilidade que encontra fá-lo regressar a Espanha para aí tentar obter a confiança do soberano: chega à Europa pouco antes da morte de Fernando, o Católico. 





Pedido vergonhoso

      Este padre experiente conhece muito bem a realidade do terreno e exige soluções radicais. A principal dificuldade no Novo Mundo é a mão de obra. Efectivamente, Las Casas não tem dúvidas, deviam proteger os índios que, afinal, eram seres humanos, ou seja, poderiam ser evangelizados pois tinham alma. Assim, Las Casas dá a solução: tragam os negros de África e, baseando-se em estudos anatómicos e da cor da pele, refere que esses não são seres humanos, logo, não é pecado serem escravos. 
      O mais impressionante é que Las Casas admite mesmo que os povos africanos, dada a sua cor de pele, tipo de cabelo e dada a sua compleição física, sejam um "erro da Natureza", avançando com a hipótese dos negros serem o resultado do cruzamento entre um ser humano e um símio. 





      Ele sugere que se inventem novas regras de relacionamento e para fixar relações entre as populações europeias e nativas das Américas. 
      Las Casas consegue em 1520 autorização para fundar um novo tipo de colónia, na Costa de Cumaná, Norte da Venezuela. Porém, os índios sabem o que já passaram e escaldados pelo que já conhecem das realidades das zonas vizinhas, acolhem os novos colonos muito mal. Enfraquecida pelas guerras que as tribos índias têm também entre si, a experiência de Las Casas termina num impressionante banho de sangue.





As "Leyes nuevas"

      Afectado por este absoluto desastre, Las Casas afasta-se durante dez anos para São Domingo, onde escreve História Geral das Índias, obra de enorme notoriedade que faz aumentar em grande escala a sua autoridade. 
     A extensão das "Encomiendas" ao antigo Império Azteca leva-o, de novo, a intervir. Em 1533, na Nicarágua denuncia a  brutalidade espanhola. Quatro anos depois, tenta fazer de uma zona insubmissa (tierra de guerra), o Tezulutlán, a tierra de la Vera Paz: um modelo de evangelização pacífico. 





      Já em 1542 regressa a Espanha por imposição da sua Ordem,. Desta vez, a sua fama é tal que é facilmente escoltado. Em 1542, Carlos V promulga as Leyes Nuevas que retomam textos antigos, reforçando a protecção do índios: interdita a sua redução à escravatura e faz desaparecer a encomienda. Las Casas obtém, finalmente, o seu reconhecimento, tornando-se bispo de Chiapas, nos confins do México e Guatemala. 

Bispo controverso

       O seu sucesso é relativo. As autoridades locais mostram-lhe hostilidade pelo facto de na sua terra recusar os sacramentos àqueles que conservam escravos índios. Os locais onde ele não está pessoalmente, tudo é pior. No Peru, a legislaçao de Carlos V leva a uma enorme revolução dos Colonos. Carlos V nada faz em absoluto para pôr termo à encomienda e Las Casas, desaprovado pelos seus superiores é obrigado a abandonar o bispado. 

      Regressa a Espanha em 1547 e não renuncia à luta. Mantém uma viva polémica com o doutor Sepúlveda. Este, apoiando-se nos estudos de Aristóteles, defende que existem seres vivos, com aparência de humanos, mas que não o são, visto não terem alma. Las Casas, pelo contrário, afirma veemente que os índios são Homens de corpo inteiro e que maltratá-los é, além de contrário à missão evangélica, um meio de privar o cristianismos de uma regeneração através da conversão sincera.  Já na questão dos negros, Las Casas concordava com Supúlveda. 

      Las Casas acaba por publicar, ainda que clandestinamente, a Brevisima Relacion de la destruccíon de las Índias, um texto que provoca um enorme escândalo e que conhece uma ampla difusão. O velho defensor dos índios morre em 1566, aos 92 anos, lamentando e culpabilizando-se por não ter conseguido fazer ainda mais por aquele povo. 





       Las Casas teria sido um exemplo mundial, à semelhança do Português Padre António Vieira, não tivesse Las Casas estado tão errado quanto aos africanos. Efectivamente, dada a sua convicção na utilidade dos africanos relativamente aos índios, muitas nações europeias começaram a fazer a substituição. Os negros mostraram vantagens relativamente aos índios: maior submissão, maior capacidade de trabalho, maior robustez e, acima de tudo, menor número de indivíduos a lutar pela sua causa.   




Fontes:
http://www.infopedia.pt/$bartolomeu-de-las-casas
Astier et al, (2000), Memória do Mundo, Cículo de Leitores

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