Uma lenda antiga reside nos confins da história da Maia, cidade do Norte de Portugal. Poucos são capazes de descrever o que ali sucedeu, contudo, muito venerado é o lugar da Campa do Preto.
"Um preto de pura alma cujo nome se perdeu servia uma casa de um fidalgote que o tempo e a lenda empurraram para o anonimato"
No ano de 1790 existia um belo solar em Guilhabreu, em Vila do Conde e, segundo os historiadores, possivelmente habitado por Gonçalo Mendes, o lidador da Maia. O fidalgo, apesar de ser reconhecida a sua aparência bem tratada, não deixava escapar as suas maneiras pouco nobres, muitíssimo provincianas na pior da formas.
Conta a história que num resplandecente dia de sol, o dito fidalgo consegue arrastar até à sua mansão uma aldeã, também ela reconhecida pela sua delicadeza e exuberante beleza. Porém, as intenções do fidalgo não eram as mais ortodoxas, ao que a rapariga, apesar de iletrada e pouco culta, recusou, repudiou e fugiu o mais que pôde, entrando na vasta seara que ali existia.
Contudo, conta a lenda que o fidalgo não terá gostado da forma como fora tratado pela plebeia. Manda juntar os seus escravos, ordenando a um deles que incendiassem toda a seara, depois, foi-lhes ordenado que se colocassem de sentinela em cada uma das saídas da seara, para que não restasse qualquer saída à rapariga e morresse, então, queimada.
Uma vez mais a lenda toma lugar da história, referindo que aqui começa a desobediência de um dos escravos negros: apaga o seu archote, para que no lado em que ele estava posicionado a seara demorasse mais a incendiar. Terá sido, então, por aí que a rapariga terá fugido, para mal do escravo, sem que este tentasse sequer impedi-la de fugir.
Se até aqui o fidalgo estaria vexado e irado, ao ter conhecimento da desobediência do escravo, terá ficado absolutamente fora de si. Chamando-o, apenas disse:
"Sela o meu cavalo, vou à festa da Senhora da Hora. E tu vais-me acompanhar"
Para grande espanto dos presentes, o fidalgo monta o seu belíssimo cavalo e lança uma forte corda ao pescoço do escravo.
Noutros tempos, há séculos atrás, a entrada para a Senhora da Hora fazia-se por Gemunde, um caminho particularmente agreste para quem o faz atado pelo pescoço a um poderoso cavalo. Efectivamente, se no início o honrado escravo acompanhou o cavalo, correndo o mais que pôde, não tardou a perder todas as suas forças, sendo fustigado por todas as pedras e rochedos do caminho.
O fidalgo atiçava cada vez mais o forte cavalo, pelo que, o já morto escravo foi deixando em cada metro do caminho partes do seu corpo já dilacerado.
O povo do lugar, por sua vez, mostrou a sua fúria contra o fidalgo assassino, recolhendo com grande veneração cada parte do corpo do "Santo Preto".
Encontraram a cabeça em Gemunde ao que, apercebendo-se que o corpo estaria completo, erigiram-lhe uma campa com grande veneração: a Campa do Preto.
O Lugar da Campa do Preto é hoje o símbolo dos tempos antigos, onde o senhor tinha o poder da vida dos seus escravos. Ali, dizem os habitantes locais, jaz o corpo de um Preto martirizado, o corpo de Santo Preto.
Curiosamente, nunca foi atribuída pela Igreja Católica nenhum reconhecimento a este bondoso homem, o Preto. De facto, todos os anos é realizada uma Festa em honra do “Santo Preto”, estritamente popular e sem presença institucional da igreja: sem missa, procissão ou pároco presente.
Milagre?
Á parte a lenda, um facto incontornável foi aquilo que sucedeu durante a Guerra Colonial. Desde o século XVIII a Campa do Preto é local de veneração para todos aqueles em grande aflição, nomeadamente pescadores de Matosinhos, ou todas as pessoas que vivem em grande aflição.
Atribui-se, então, a este Santo renegado pela Igreja, o verdadeiro milagre de na Guerra Colonial não ter morrido um só homem, um só jovem desta terra de Gemunde, ao contrário daquilo que aconteceu nas terras vizinhas.
Discórdia com a Igreja
Este culto sempre foi apontado pela Igreja como algo pagão. Decorria o ano de 1841 e tentou-se pôr um ponto final a esta “religião”. Uma das tentativas foi quando o “Prelado Diocesano” fez uma exortação pastoral sobre o tema, com o intuito de alertar os fiéis devotos do“Santo Preto”. Efectivamente, estiveram envolvidos o Administrador Geral do Distrito, juntamente com as Forças da Infantaria e Cavalaria, saídos do Porto tendo cercado o local de culto, procedendo ao
“Exame de Averiguação (…) dos fundamentos que havia para a crença dos povos d’aquella e das visinhas freguezias, que veneravão alli a existência dos despojos mortaes de hum homem de cor preta que por tradição se diz foram sepultados naquelle sítio”.
Começou-se a escavação do local. Nem um só vestígio de cadáver foi apontado pelas autoridades. Perante isto, a campa foi brutalmente arrasada, revolvida e remexida. Contudo, trinta anos depois, em 1871, uma Confraria clandestina apontou como certo a existência das ossadas do Santo homem ali perto, a poucos metros de distância. Contrariando toda a vontade da Santa Igreja, o culto voltou em força, sendo-lhe atribuídos vários milagres desde então, incluíndo também aquele da Guerra Colonial.
Já na actualidade, a população local considera mais uma afronta da Igreja o facto de um pároco ter excomungado as bandas de musicias que tocavam na Festa da Campa do Preto.
Não se registaram mais lutas ou braços de ferro com a Igreja. Ou tolera, ou simplesmente desistiu do monopólio das santidades.
Fontes:
Junta de Freguesia de Gemunde
Gostei.
ResponderEliminarFekiz Natal 2011
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarUma lenda , é uma lenda . Mas , todo este Mundo tem as suas lendas . No fundo há sempre algo de verdade que lhes deu forma . Não será científico . . . Mas , mais uma vez o clero esteve mal . A « freguesia » do Vaticano , nunca respeitou as crenças populares : É pena ! Uma das fortes razões que " afugenta " tantos crentes . Essa , de como dizia o pároco Fernandes da minha freguesia décadas atrás : olha para o que eu digo , não olhes para o que eu faço . . . é demasiado cómodo e pouco " ortodoxo " ! . . . Como vou acreditar numa igreja que nomeou PAPA um jovem de 13 anos de idade , na idade média , por ser Conde ; e que implantou o capítulo mais horrendo da História : A INQUISIÇÃO , e que « fabricava » as orgias no Vaticano , no tempo da Lucrécia Borges """""""""""""""""" ? !!!!!!!!!!!!!!!!
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