Há cerca de 5 000 anos, no ano 3 000 aC, aproximadamente, um país do médio oriente, a Suméria, atinge em apenas alguns séculos duas épocas áureas em domínios tão diferentes como o período político, a actividade económica, a reflexão religiosa e a criação literária. Este sucesso está ligado à invenção dum sistema de escrita, ferramenta notável de comunicação.
Embora a agricultura e a pastorícia desempenhem ainda um papel fundamental no mundo sumério, este é essencialmente urbano. No III milénio, o país agrupa uma dúzia de estados, centrados numa cidade normalmente fortificada, em torno da qual se aglomeram centenas de aldeias dispersas por entre o território rural. A sociedade organiza-se em torno de dois pólos: o templo e o palácio real.
O templo
Apanágio da divindade própria de cada cidade, o templo aparece, num primeiro tempo, como o edifício mais grandioso, mas cuidado e mais rico da cidade. Construído num aterro e flanqueado por uma fortificação maciça com vários andares, o zigurate, goza de meios consideráveis, provenientes das terras, dos entrepostos, das manufacturas e participa num comércio que se estende muito para além da Suméria. Uma mão-de-obra abundante, composta por homens livres e escravos, assegura o funcionamento deste lugar privilegiado da vida religiosa, económica e política.
A monarquia militar
O outro edifício notável na cidade é o palácio, construção da monarquia. Esta monarquia é, por volta de 2 500 aC uma instituição nova. O rei é, então, um rei guerreiro. A sua função principal é militar, justificada pelas guerras contínuas que as cidades travam entre si e pela pressão que sofrem dos estrangeiros bárbaros. Os soberanos dotam-se, então, de um exército regular que reforçam, em caso de conflito, com uma milícia de camponeses.
Vestígios arqueológicos, como os fragmentos da Estrela dos Abutres de Eannatum, rei de Lagash, permitem conhecer o armamento, a organização e a táctica das tropas: estas associam carros e uma infantaria ligeira a uma infantaria pesada, avançando para a batalha em filas serradas.
fragmento de Estrela dos Abutres
Com o tempo, o rei ultrapassa o templo em importância. O rei já não é apenas um chefe, militar, mas também um chefe civil. Os grandes dignitários religiosos estão subordinados à sua autoridade e, progressivamente, ele irá converter-se no senhor único no país. O seu poder deve ser exercido num sentido favorável: representante dos deuses na terra, o rei é responsável perante eles pelo bem-estar do povo. Os seus deveres impõe-lhe fazer a guerra para defender e alargar os seus domínios, mas também criar e manter os sistemas de canais de irrigação que é a causa da fertilidade do país, logo, de toda a sua abundância. Garante da ordem legal e da equidade perante os seus súbditos, o rei deve zelar para que o fraco não seja vítima da opressão do poderoso e o simples cidadão dos abusos dos funcionários corruptos.
A escrita ao serviço do templo e do palácio
Uma definição tão ambiciosa da função do rei supõe a existência de meios apropriados. O génio dos sumérios reside em terem inventado um sistema de comunicação entre os homens que já não se limitava à palavra: a escrita.
Excelentes escultores e gravadores de imagens, inventores do selo cilíndrico, o pequeno rolo de pedra ornamentado com desenhos e cenas, e cuja utilização se alastra à Anatólia, Egipto e Grécia, pela primeira vez no mundo, os sumérios inventam um conjunto organizado de sinais e símbolos visuais, capaz de traduzir pensamentos, conhecimentos e sentimentos humanos: a escrita cuneiforme.
selo cilíndrico
Esta invenção corresponde a um projecto teológico e político: todos os textos, no que se refere ao teor e objectivo se relacionam com a religião ou com a pessoa do rei. Os mitos, sob aparência de aventuras das divindades, respondem às questões que os Homens colocam sobre as origens e o sentido do mundo. Os hinos recitados, aquando das cerimónias, exaltam os deuses e os seus santuários. As preces, associadas aos gestos rituais, têm como objectivo afastar as causas sobrenaturais dos males que atingem os Homens. Por seu lado, a monarquia é glorificada em obras que contam os feitos sobrenaturais dos primeiros reis da Suméria.
Com a elaboração de um sistema de escrita, os sumérios, artesãos de uma das mais férteis épocas do Médio Oriente antigo, desenvolvem e revolucionam as comunicações entre os Homens e inflectiram a vida material e intelectual. Neste sentido, a Mesopotâmia foi «o berço da civilização».
A escrita cuneiforme
A escrita inventada pelos sumérios, utilizada até à era Cristã e difundida por diversas regiões do Médio Oriente, deve o seu nome à aparência de cunhas ou de pregos que o seu material de suporte, a argila, que os escribas imprimem por pequenas incisões toma. Originariamente, os signos reproduziam objectos e realidades ligadas aos sumérios: o sistema pictográfico. Mais tarde, a escrita prende-se à língua falada: o signo já não representa um objecto, mas um som. O sistema gráfico torna-se então uma escrita de palavras, capaz de comunicar as ideias mais abstractas, em vez de ser apenas um auxiliar da memória.
Contudo, durante muito tempo não se fez a diferença entre o pictograma e o símbolo que significava som. Na escrita cuneiforme, os 400 signos utilizados conservam assim um duplo valor , ideográfico e fonético; eis porque um texto cuneiforme nunca é lido de forma corrente, mas antes, decifrado.
Os grandes sistemas de escrita da história
- escrita e comunicação social
A escrita cuneiforme pôde influenciar, a oeste, os hieróglifos egípcios (pouco depois de 3 000 aC), a leste a Índia ( 2 500 aC) e a China (entre 3 000 e 2 500). Mas, em todos estes reinos, a fixação precoce de um sistema de escrita responde aos imperativos do bom funcionamento da sociedade: o registo dos dados para sua utilização (administração, codificação de leis, formulação de tradições sagradas, …), a difusão de informações a uma vasta escala (cartas, éditos reais) e a prática cerimonial.
- escrita e poder
Considerada de origem divina e revestida de carácter sagrado, a escrita é reservada, por motivos técnicos (complexidade quanto á aprendizagem e caligrafia) e ideológicos, a uma casta privilegiada: num país de tradição escrita, a sua monopolização por uma elite de escribas ao serviço dos templos e soberanos constituía um enorme instrumento de poder e controlo excepcionais.
- a diversificação
Na origem, há 4 sistemas de escrita: o sumério, o egípcio, o hitito-egeu e o chinês. Dois provêm de escritas silábicas; e destas, os sistemas alfabéticos (grego e latim; hebreu e árabe; indiano) que se distinguem pelo processo dedicado e reservado à indicação das vogais.
Em 1802, já na Idade Contemporânea, a primeira pessoa a decifrar a escrita cuneiforme foi o alemão Georg Friedrich Grotefend.
Fonte:
Astier C, 2000, Memória do Mundo - das Origens ao ano 2 000, Círculo de Leitores
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